A prorrogação da isenção de imposto de importação para dispositivos médicos é a prova de que não aprendemos nada com a pandemia

Por Paulo Henrique Fraccaro, Superintendente da ABIMO – Associação Brasileira da Indústria de Dispositivos Médicos

No apagar das luzes do fim de um governo que terminou de forma melancólica, o Ministério da Economia prorrogou a redução temporária da alíquota zero para uma série de insumos hospitalares, incluindo dispositivos médicos. Essa medida foi tomada no início da pandemia do coronavírus, para facilitar a compra de itens necessários para tratar pacientes, num cenário de escassez de insumos e alta demanda em todo o mundo. Porém, quase três anos após o início da emergência sanitária e sem qualquer demanda extra — muito pelo contrário, há excesso de alguns produtos hoje no mercado brasileiro — a medida não faz sentido. Muito pelo contrário: é maléfica para o mercado nacional, já que praticamente inviabiliza a produção de alguns itens dentro do país, como luvas e máscaras descartáveis, por exemplo.

A resolução GECEX n.º 438 publicada no Diário Oficial da União no dia 23 de dezembro segue eliminando empregos e diminuindo a capacidade da indústria brasileira de dispositivos médicos de concorrer com as mesmas condições com produtos importados. Ela é a síntese da falta de memória do governo e da injustiça com um setor que foi fundamental para salvar vidas durante o período mais crítico da nossa história recente. E aqui, não se trata de argumento protecionista; a alíquota zero foi uma medida emergencial, que deveria ter se encerrado no mesmo momento em que passamos a não ter escassez de produtos no mercado.

Inclusive, vale lembrar que a demanda foi resolvida não com os importados, mas com os investimentos que o setor de saúde fez ao longo de 2020 para suprir a demanda, uma vez que todos os países priorizaram seus mercados, em detrimento à exportação. Ou seja: no momento em que mais precisamos, a indústria brasileira investiu e entregou o que o Brasil precisava para curar seus doentes que lotavam hospitais. E como prêmio, ganhou uma concorrência injusta, que inviabiliza sua existência e que está sendo mantida sem qualquer justificativa ou medida plausível.

Temos, inclusive, efeitos nefastos da prorrogação sem justificativa do imposto de importação para dispositivos médicos, com empresas perdendo todo o investimento e fechando postos de trabalho porque simplesmente é impossível concorrer com os importados, por mais produtivo e inovador que o setor seja.

Vale lembrar que, após a pandemia, os principais países passaram a tratar a indústria de medical devices como estratégica. Para nosso azar enquanto país, não aprendemos a lição. Aqui, seguimos penalizando quem gera emprego e renda e apostando na dependência do que vem da China — que já demonstrou não ter pudores para fechar seu mercado para o mundo, colocando sua população em primeiro lugar. É exatamente o que deveríamos fazer, mas fechamos 2022 repetindo os erros do passado: dependência de importações e punição para quem investe no Brasil.

O novo governo assume com a missão de recolocar o país nos trilhos. Isso passa, necessariamente, por entender que é preciso um novo olhar — estratégico — sobre a saúde e sobre as bases que sustentam o cuidado no país. Ver a indústria de dispositivos médicos como estratégica é fundamental para estarmos mais preparados para os próximos desafios de saúde coletiva que estão por vir. É fundamental dar condições de igualdade para a produção nacional. Portanto, esperamos que o governo reconheça o problema e revogue a desmedida que tanto coloca em risco a geração de trabalho e renda. Mandamos a saúde feita no Brasil para a UTI. Precisamos tirá-la de lá urgente.

Publicado em 10/01/2023

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