Com investimento do distribuidor local e estratégia cuidadosa, fabricante brasileira entra para o restrito mercado chinês de neurocirurgia
A China, com mais de 1,4 bilhão de habitantes e um sistema de saúde que combina cobertura pública quase universal com um setor privado em crescimento, é hoje um dos mercados mais complexos e promissores do mundo. O país valoriza tanto a medicina moderna quanto a tradicional, tem rígidos processos regulatórios e uma cultura de negócios que exige tempo, confiança e adaptação.
Nesse cenário desafiador, a Hpbio, fabricante brasileira de dispositivos médicos associada à ABIMO, alcançou uma conquista histórica ao obter o registro local de sua válvula programável para uso em neurocirurgia. Com isso, passou a integrar um seleto grupo mundial: são apenas cinco opções disponíveis para os médicos chineses, o que torna essa conquista ainda mais extraordinária.
A trajetória até essa aprovação foi longa. O interesse surgiu há seis anos, quando um distribuidor chinês buscava produtos altamente especializados e com baixa disponibilidade no mercado global. A válvula programável da Hpbio, que tem similares sendo produzidos por apenas quatro outros fabricantes no mundo, chamou a atenção.
O implante – feito em polysulfona com revestimento em silicone e conectores em titânio – foi pensado para proporcionar precisão no controle e facilidade no ajuste da pressão que pode ser feito por um dispositivo magnético não invasivo e indolor ao paciente, além de segurança contra desprogramação com um sistema de duplo travamento.
Considerando a qualidade e inovação do produto, o distribuidor decidiu investir diretamente no processo de registro, arcando com a revalidação de todos os testes já realizados no Brasil, agora em laboratórios chineses, uma exigência regulatória local. A pandemia atrasou os planos, e o que poderia ter levado três anos se estendeu por cinco. A autorização saiu apenas no início de 2025, após inspeção presencial do governo chinês na fábrica da Hpbio em São Paulo (SP).
“Foi um processo extremamente complexo, mas necessário para abrir as portas do mercado chinês. Com isso, nos tornamos a mais nova opção de válvula programável em um grupo bastante restrito atuante no país, o que nos coloca em um patamar de grande responsabilidade”, relata Flávia Rodrigues Carvalho, diretora de Negócios Internacionais da Hpbio.
Estratégia alinhada
A empresa adotou medidas estratégicas para proteger sua inovação, como o registro da patente da válvula na China antes mesmo de iniciar a negociação. Além disso, incluiu cláusulas inéditas no contrato com o distribuidor, exigindo que um profissional chinês viesse ao Brasil para treinamento presencial e participação em cirurgias, tornando-se um especialista no produto. “Foi a primeira vez que incluímos essa exigência. Entendemos que os desafios do mercado chinês são mais densos e queríamos garantir que o produto tivesse acompanhamento técnico adequado”, explica Flávia.
As barreiras culturais e linguísticas também foram marcantes. “Senti muita dificuldade em ser compreendida. Fiz até um curso sobre a cultura chinesa para entender melhor como funciona a mentalidade local. Aprendi a usar palavras, exemplos e metáforas mais familiares para eles, o que ajudou bastante”, comenta.
A conquista da Hpbio simboliza não apenas a expansão da empresa, mas também a força da indústria nacional de dispositivos médicos frente aos fabricantes mundiais. Em um momento em que exportadores brasileiros buscam diversificar mercados diante do tarifaço imposto pelos Estados Unidos, a presença no gigante asiático reforça o potencial da #saudefeitanobrasil em competir globalmente com inovação, qualidade e resiliência.
Publicado em 19/09/2025